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13 de abril de 2024

Ampliação da competência de câmaras empresariais do TJ-SP é bem-vista, mas há ressalvas

Estabelecida com a publicação de uma resolução pelo Tribunal de Justiça de São Paulo, a ampliação da competência das Câmaras Reservadas de Direito Empresarial da corte é tida como positiva por advogados que atuam nessa área, uma vez que os magistrados que compõem essas câmaras já têm larga experiência em temas correlatos.

No entanto, há ressalvas à medida: o aumento das possibilidades de julgamento nas questões relacionadas às falências e recuperações judiciais gerou certo incômodo, já que uma maior gama de assuntos na alçada dos desembargadores pode corroer o viés especializado dessas câmaras.

A Resolução 920 de 2024 foi publicada no mês passado para incluir na competência dessas câmaras temas como franquias (Lei 8.955/1994); execuções em sociedades anônimas do futebol (SAFs); e ações que envolvem a Lei Ferrari. Também serão incluídos no rol de competências das câmaras recursos sobre contratos de distribuição, agência e representação comercial.

Ao justificar a resolução, o presidente do tribunal, desembargador Torres Garcia, afirmou que há um “baixo número de recursos que aportam às câmaras empresariais, em flagrante desproporção com as demais subseções”, e que cabe ao TJ-SP “adotar medidas necessárias ao atendimento do princípio da razoável duração do processo e equilíbrio entre os magistrados que as integram”.

Números do desequilíbrio

Dados do próprio TJ-SP mostram que, enquanto as Câmaras Reservadas de Direito Empresarial julgaram cerca de 15 mil processos em 2022, somente a Subseção de Direito Privado 1 analisou quase 200 mil ações. Ao todo, a Seção de Direito Privado da corte julgou mais de 590 mil processos naquele ano.

“A medida, em princípio, parece salutar, pois a especialização da prestação jurisdicional (juízes especializados em determinada área de conhecimento do Direito) é sempre bem-vinda, pois, ao menos em teoria, tem-se com isso uma melhor qualidade na atuação jurisdicional”, diz José Arnaldo Cione Filho, sócio do escritório LCSC Advogados.

A ressalva em relação à resolução, diz Cione Filho, é que o TJ-SP pensou somente na melhor distribuição dos processos, e não necessariamente na maior especialização dos magistrados. “Do ponto de vista prático, o que se espera é, afora a ampliação das áreas de conhecimento do Direito a serem tratadas pelas câmaras especializadas, que certamente haverá um aumento no volume de feitos para cada julgador, o que nos leva a um receio de piora da prestação jurisdicional.”

Gustavo Mizrahi, sócio do escritório Vieites Mizrahi Rei Advogados, diz que a resolução do TJ-SP é “uma medida que merece aplauso”. Segundo ele, as novas competências podem deixar os processos mais céleres.

“Não serão só as antigas matérias de recuperação e falências, de maneira geral, e franquias, que serão julgadas. Agora, outros temas também de natureza empresarial ficarão na competência das câmaras empresariais. Isso não só melhora a qualidade da prestação jurisdicional, na medida em que é possível ter desembargadores mais bem preparados tecnicamente para apreciar e decidir essas matérias, como também melhora a agilidade, dada a concentração de matérias submetidas.”

Falência e RJ preocupam

Entre as críticas à resolução, a principal está no campo da insolvência. A administradora judicial Lívia Gavioli Machado, sócia da Ativos Administração Judicial, por exemplo, afirma que parte do setor entende que a medida do TJ-SP “deveria observar a relevância da especialização das câmaras, por tratar de questões complexas e ter na jurisprudência o balizador de pontos controversos”.

Bruno Boris, advogado e professor da Universidade Presbiteriana Mackenzie, afirma que, em tese, o julgamento de temas complexos por magistrados especializados é mais efetivo. Ele entende, no entanto, que a inclusão de outros assuntos pode gerar um acúmulo de trabalho nas câmaras.

“Muitas empresas utilizam a RJ como ferramenta para negociar dívidas, pois perceberam que é um instrumento positivo. Dessa forma, as câmaras estão tendo, a princípio, bastante trabalho. O tribunal deve ter avaliado numericamente o que poderia afetar, porque é certo que as câmaras que tratam de falências e recuperação têm muita demanda”, diz Boris, para quem seria positivo aumentar o número de câmaras reservadas para diluir um possível alto número de processos

Luciana Magnolo Onofre, advogada do Maia & Anjos Advogados, tem posição mais incisiva em relação aos processos falimentares. Para ela, a especialização que ocorreu no tribunal foi benéfica para o Direito Empresarial, otimizando o tempo e reduzindo erros decorrentes da falta de conhecimento sobre o tema. Por isso, Luciana está procupada com a ampliação da competência das câmaras.

“A abrangência poderá gerar uma nova generalização e, consequentemente, trazer de volta problemas enfrentados antes da criação das câmaras especializadas”, afirma a advogada. “No que diz respeito a questões de falência, recuperação judicial e extrajudicial, especialmente, a competência generalizada pode ser preocupante, dada a complexidade e a especificidade desses assuntos e a necessidade de especialização adequada por parte dos julgadores.”

“Para o caso específico dessa matéria, a Resolução 920/2024 trouxe uma abrangência que submeterá litígios falimentares ou recuperacionais a julgadores sem a expertise adequada, ou seja, o efeito nesse caso seria um retrocesso em relação ao que já havia se consolidado pelo tribunal”, completou Luciana.

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